O Paquistão foi fundado como Estado secular na altura da partição da Índia em 1947. Só gradualmente é que o carácter muçulmano mais militante do país se afirmou, quando assumiu uma orientação distintamente islâmica sob a ditadura do General Zia ul-Haq, no poder de 1977 a 1988. Como consequência, a lei islâmica (sharia) passou a desempenhar um papel principal no sistema legal paquistanês.
A população é quase inteiramente muçulmana, na sua maioria sunita (entre 85 e 90%). Os xiitas são cerca de 10-15%. As minorias religiosas, na sua maioria Cristãos, Hindus e Ahmadis, mais alguns Bahá’ís, Sikhs, Parsis e uma comunidade judaica em declínio, constituem apenas 3,6% da população. Os principais grupos étnicos são: Punjabis (44,7%), Pashtuns (Pathans) (15,4%), Sindhis (14,1%), Saraikis (8,4%), Muhajirs (7,6%), Balochis (3,6%), e outros (6,3%).
O Paquistão é signatário da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 e ratificou o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos (ICCPR) em 2010. Por conseguinte, é obrigado, nos termos do artigo 18.º, a proporcionar ao seu povo condições para que haja liberdade de pensamento, consciência e religião.
Embora o artigo 2.º da Constituição paquistanesa de 1973 (revista várias vezes, mais recentemente em 2015) declare que "o Islamismo é a religião estatal do Paquistão", aparentemente o mesmo documento garante também direitos às minorias religiosas. De facto, no seu preâmbulo, a Constituição diz que "devem ser tomadas disposições adequadas para que as minorias possam professar e praticar livremente as suas religiões e desenvolver as suas culturas". O artigo 20.º (alíneas a e b) reconhece que "cada cidadão terá o direito de professar, praticar e propagar a sua religião", e que cada denominação religiosa tem "o direito de estabelecer, manter e gerir as suas instituições religiosas".
O artigo 21.º diz que "nenhuma pessoa será obrigada a pagar qualquer imposto especial, cujo produto se destine à propagação ou manutenção de qualquer outra religião que não a sua". O artigo 22.º (n.º 1 e 3) contém "salvaguardas quanto às instituições de ensino em termos de religião", observando claramente que "nenhuma pessoa que frequente qualquer instituição de ensino será obrigada a receber instrução religiosa", e que "nenhuma comunidade ou denominação religiosa será impedida de disponibilizar instrução religiosa aos alunos dessa comunidade".
Na realidade, contudo, este artigo não é aplicado, uma vez que muitos estudantes nas escolas públicas são obrigados a frequentar aulas de Alcorão ou a frequentar cursos islâmicos e, se não o fizerem, perdem créditos importantes necessários para concluir o ano lectivo. Além disso, nas escolas públicas, disciplinas como história, literatura e matemática são fortemente permeadas por preceitos islâmicos. Recentemente, o Governo do Punjab tornou obrigatório o ensino do Alcorão a nível universitário.
No artigo 260.º (n.º 3, alínea b) da Constituição, é feita uma distinção entre muçulmanos e não muçulmanos, o que alimenta o preconceito religioso e alimenta atitudes discriminatórias em relação, por exemplo, à comunidade ahmadi, que é descrita como não muçulmana. O artigo 41.º (alínea b) é inequivocamente discriminatório quando afirma: "Uma pessoa não será qualificada para ser eleita como presidente, a menos que seja muçulmana". O artigo 91.º (n.º 3) estipula também que o primeiro-ministro deve ser muçulmano. Nos termos do artigo 203.º D, o Tribunal Federal Islâmico tem o poder de invalidar qualquer lei contrária ao Islamismo e de sugerir alterações à lei.
O sistema eleitoral do Paquistão é igualmente discriminatório, facto que voltou a ser salientado nas eleições legislativas realizadas em Julho de 2018. O Paquistão tem um presidente eleito por um colégio eleitoral composto por membros da Assembleia Nacional e membros das Assembleias Provinciais. Não há eleições presidenciais à escala nacional.
O Parlamento bicameral do país inclui uma Assembleia Nacional com 342 membros e um Senado com 104 membros. Na Câmara Baixa, 272 lugares são eleitos de acordo com o sistema de primeiros lugares, enquanto os outros 70 lugares são reservados, 60 para mulheres (eleitas através de representação proporcional) e 10 para minorias não muçulmanas (eleitas num único círculo eleitoral a nível nacional). Os senadores são eleitos pelas quatro assembleias provinciais do país, um reflexo da natureza federal do Estado paquistanês, mas também neste caso são reservados lugares para mulheres e minorias.
Embora isto garanta alguma representação para estes grupos, as mulheres e as minorias são literalmente excluídas da candidatura para os outros (mais de 300) lugares. Esta situação levou muitos políticos não muçulmanos a associarem-se a partidos políticos liderados por muçulmanos, o que é menos eficaz em termos de promoção de políticas destinadas a melhorar a situação das minorias. Os candidatos eleitos para lugares reservados continuam vinculados à disciplina partidária, mesmo que isso signifique ignorar as preocupações da sua própria comunidade.
O estatuto das minorias religiosas é ainda afectado pelas chamadas "leis da blasfémia" do Paquistão, introduzidas pelo General Zia-ul-Haq entre 1982 e 1986. Estritamente falando, não são leis mas sim alterações ao Código Penal, nomeadamente as secções 295B, 295C, 298A, 298B e 298C, que restringem severamente a liberdade religiosa e a liberdade de expressão. Os delitos puníveis incluem "desrespeitar" o Alcorão e insultar o Profeta Maomé, com penas máximas de prisão perpétua e pena de morte, respectivamente.
Como o conceito de "blasfémia" é bastante amplo, a noção é facilmente abusada para sancionar vários tipos de conduta, incluindo a irreverência em relação a pessoas, objectos de culto, costumes e crenças. Enquanto a Secção 295A protege todas as religiões de "actos deliberados e maliciosos destinados a ultrajar sentimentos religiosos", os parágrafos seguintes e as secções 298B e 298C visam exclusivamente condutas consideradas anti-islâmicas.
Historicamente, o sistema legal do Paquistão é uma combinação da common law inglesa e da sharia, mas as práticas legais são islamocêntricas, especialmente desde que o Código Penal foi alterado na década de 80. Não surpreende, portanto, que, entre 1947 (quando o Paquistão foi fundado) e a década de 80 (quando as alterações foram introduzidas), tenham sido registados apenas seis casos de blasfémia, por comparação com 1.550 casos apresentados entre 1987 e 2017.
Embora no período em análise algumas pessoas acusadas de blasfémia tenham sido libertadas, incluindo a agora bem conhecida Asia Bibi, o volume de casos e sentenças de morte por blasfémia não diminuiu.
Foram feitas acusações de blasfémia tanto contra muçulmanos como contra membros de minorias religiosas. Contudo, quando estão envolvidos não muçulmanos, as acusações resultam frequentemente em linchamentos, ataques de multidões em fúria a bairros inteiros e execuções extrajudiciais. Além disso, o número de crentes minoritários acusados de blasfémia é altamente desproporcionado em relação à sua quota-parte da população. Das 1.550 pessoas acusadas de blasfémia entre 1986 e 2017, 720 eram muçulmanos, 516 ahmadis, 238 cristãos, 31 hindus e 44 sem religião conhecida. Isto significa que 46,45% dos acusados eram muçulmanos (que representam 96,4% da população), enquanto 50,7% envolviam minorias (que representam 3,6% da população). Destes, 33,5% eram ahmadis, 15,3% eram cristãos e 2% eram hindus.
São particularmente preocupantes as secções 298B e 298C do Código Penal do Paquistão, que foram promulgadas no tempo de Zia-ul-Haq através da Portaria XX de 1984. Esta tornou crime o facto de os Ahmadis se intitularem muçulmanos ou de se referirem à sua fé como Islamismo.
Nas palavras de Omar Waraich, chefe do gabinete da Amnistia Internacional no Sul da Ásia: "Há poucas comunidades no Paquistão que tenham sofrido tanto como os Ahmadis". Algumas fontes mencionam que entre 1984 e 2019, 262 ahmadis foram mortos por causa da sua fé, 388 sofreram violência e 29 mesquitas ahmadi foram destruídas. Por lei, os Ahmadis não podem ter as suas próprias mesquitas, ou fazer o apelo à oração, e para poderem votar têm de ser classificados como não muçulmanos ou aderir a uma das principais correntes do Islão.
A perseguição dos Ahmadis remonta à fundação do movimento no final do séc. XIX. Embora aceitem Maomé como profeta, são considerados heréticos pelos Muçulmanos da linha dominante porque acreditam que o seu fundador, Mirza Ghulam Ahmad, era o Mahdi, uma figura messiânica no Islamismo que também acreditava que era a reencarnação de Maomé, de Jesus e do deus hindu Krishna.
Em Julho de 2020, a Assembleia Provincial do Punjab aprovou um projecto de lei, a Lei de Protecção da Fundação do Islão (Tahaffuz-e-Bunyad-e-Islam), que é motivo de grande preocupação. A nova lei impõe essencialmente uma definição sunita do Islamismo, proíbe qualquer material impresso considerado ofensivo para Maomé e outras figuras religiosas sagradas e exige que, ao falarem do próprio profeta, as pessoas precedam o seu nome com o título "Último profeta de Deus" (Khatam-an-Nabiyyin), seguido da invocação árabe "Que a paz esteja com ele" (sallallahu alaihi wasallam).
A educação é outro domínio onde as alegações de blasfémia e violência contra minorias estão a crescer. No seu estudo de sete anos intitulado "Educação e Liberdade Religiosa: uma folha informativa", a Comissão Nacional (católica) Justiça e Paz constatou que os currículos escolares e universitários promovem a discriminação contra os não muçulmanos. De acordo com o relatório, "inexactidões factuais, revisionismo histórico e omissões facilmente reconhecíveis ensinam uma versão da história que é decididamente monolítica, reforçam estereótipos negativos e criam uma narrativa de conflito contra as minorias religiosas".
Os currículos e manuais escolares desempenham um papel essencial na promoção de uma cultura de intolerância para com as minorias e há muita preocupação com o chamado Currículo Nacional Único (SNC), programado para ser implementado em 2021. A Comissão de Direitos Humanos do Paquistão manifestou a preocupação de que o SNC possa "violar a garantia constitucional de que nenhum membro de uma minoria religiosa seja obrigado a ‘receber instrução religiosa’ não relevante para a sua própria religião".
Em 2020, o Governo criou uma Comissão Nacional para as Minorias (NCM). Esta decisão foi motivada por uma ordem do Supremo Tribunal do Paquistão em Junho de 2014 para que se criasse uma agência para proteger as minorias, uma decisão influenciada por um ataque contra uma igreja em Peshawar em Setembro de 2013. Em Maio de 2020, o Ministério dos Assuntos Religiosos e da Harmonia Inter-Religiosa notificou também a NCM reconstituída e o seu mandato para que assegurasse que os locais de culto das comunidades não muçulmanas sejam preservados e mantidos em condições de funcionamento. Contudo, o estatuto da NCM é incerto, uma vez que se trata simplesmente de um organismo ad hoc criado pelo Governo federal e não de uma agência estabelecida por lei, sendo os seus poderes limitados. Além disso, os Ahmadis não estão representados neste organismo porque, para citar o Ministro da Informação Shibli Faraz, eles não "cabem na definição de minorias". Por último, mas não menos importante, desde a adopção da 18.ª emenda à Constituição em 2010, as minorias tornaram-se uma questão provincial, e a NCM não tem qualquer poder legal para fazer cumprir as suas resoluções.
O casamento é outra grande questão jurídica que tem afectado as minorias religiosas. Para os Cristãos, houve algumas melhorias. Em 2019, o Supremo Tribunal do Paquistão decidiu que os Cristãos podiam registar os seus casamentos com uma certidão de casamento.
Ainda assim, não houve outras melhorias. Segundo a lei paquistanesa, a idade mínima para casar é de 18 anos, mas isso tem sido constantemente ignorado pelos tribunais que aceitam práticas de casamento islâmicas que permitem que as raparigas casem quando têm o seu primeiro período.
Esta questão é particularmente sensível devido ao casamento forçado e à conversão de raparigas cristãs e hindus. Para lidar com a situação, a assembleia provincial do Sindh aprovou em 2013 a Lei de Restrição ao Casamento de Crianças em Sindh, a única província que o fez. Contudo, a mesma província tem o maior número de casos de casamento forçado. Algumas raparigas raptadas foram devolvidas às suas famílias durante o período em análise, mas a lei não pode anular os casamentos islâmicos mesmo que se possa provar que a rapariga era menor de idade quando se casou.
Parece ser necessária uma lei nacional. O Senado paquistanês tentou resolver a questão em 2020. O seu Comité Permanente de Protecção das Minorias contra as Conversões Forçadas começou a analisar o assunto em Julho de 2020. A Lei de Protecção dos Direitos das Minorias foi introduzida no Senado em Agosto, mas a Comissão Permanente de Assuntos Religiosos e Harmonia Inter-Religiosa rejeitou-a um mês mais tarde, com o argumento de que "às minorias no Paquistão já foram concedidos vários direitos". Em Novembro, o projecto de lei foi reintroduzido no Senado. Se for aprovado, proibirá as conversões forçadas e o conteúdo anti-minorias nos livros escolares, impondo sete anos de prisão e uma multa por conversão forçada e 14 anos de prisão em caso de casamentos forçados que envolvam membros de minorias.
Durante o período em análise houve dezenas de incidentes que afectaram a liberdade religiosa, bem como desenvolvimentos positivos e negativos.
Do lado positivo, desde que o primeiro-ministro Imran Khan e o seu Partido Tehreek-e-Insaf chegaram ao poder em Agosto de 2018, foram dados alguns passos positivos a favor das minorias.
O Governo enfrentou os extremistas liderados pelo Tehrik-e-Labaik Pakistan (TLP) que exigiam que fosse revogada a absolvição de Asia Bibi de Outubro de 2018. Em vez de ceder às suas exigências, as autoridades prenderam membros da liderança do TLP.
Em relação aos Hindus e Sikhs, poucos dias antes do 550.º aniversário do nascimento do fundador do Sikhismo, Guru Nanak, a 12 de Novembro de 2019, o Governo abriu o corredor de Kartarpur, permitindo que os peregrinos sikh visitassem o Gurdwara Darbar Sahib, um dos santuários mais sagrados do Sikhismo, localizado na província paquistanesa de Punjab. Para os peregrinos sikh da Índia, o corredor reduz o tempo de viagem, o custo e a burocracia na fronteira.
Apesar destes progressos, a vida dos membros das minorias do Paquistão continua a ser difícil. O mesmo é verdade para a comunidade xiita do Paquistão, a maior minoria do país, que continua a ser alvo de ataques violentos. Em particular, a comunidade xiita hazara, estabelecida principalmente em Quetta, no Balochistão, tem sido frequentemente atacada por militantes. Um relatório divulgado pela Comissão Nacional dos Direitos Humanos relatou que 509 hazaras foram mortos e 627 feridos em vários actos de terrorismo em Quetta durante os últimos cinco anos.
Também não é surpreendente que a perseguição contra os Ahmadis tenha continuado nos últimos dois anos desde que o primeiro-ministro Khan apoiou publicamente leis e grupos anti-ahmadi durante a campanha eleitoral de 2018. Uma vez eleito, Khan nomeou um ahmadi, o Dr. Atif Mian, para o Conselho Consultivo Económico (EAC), mas, na sequência de protestos de membros e apoiantes do seu próprio partido, revogou a sua decisão.
O terrorismo contra as minorias também prosseguiu sem cessar. O Paquistão ocupava o quinto lugar no Índice Global de Terrorismo de 2019 e foi um dos 10 países que representou 87% das mortes relacionadas com o terrorismo em 2018.
A comunidade xiita hazara foi frequentemente visada. Um ataque suicida a 12 de Abril de 2019, num mercado de vegetais na área de Hazar Gunji em Quetta, matou 21 pessoas e deixou 50 gravemente feridas. O mercado é frequentado por comerciantes hazara. O ataque foi reivindicado pelo autoproclamado Estado Islâmico.
No início de Setembro de 2020, grupos extremistas sunitas organizaram pelo menos quatro manifestações anti-xiitas sem precedentes, durante as quais os Xiitas foram descritos como "heréticos" e "infiéis", isto no meio da aparente indiferença das autoridades paquistanesas.
Nesse mesmo mês, pelo menos cinco xiitas foram mortos em diferentes partes do país em actos de violência sectária, enquanto mais de 30 casos de blasfémia foram apresentados contra xiitas. Pelo menos uma congregação xiita foi atacada e vários vídeos apareceram nas redes sociais mostrando xiitas a serem obrigados a aceitar a visão sunita da história dos califas.
A 8 de Maio de 2019, durante o mês sagrado do Ramadão, uma bomba explodiu matando 13 pessoas perto de Data Darbar, um importante santuário sufi em Lahore, onde estavam centenas de peregrinos. Hizbul Ahrar, um grupo dissidente do Jamaat-ul-Ahrar e do Tehrik-i-Taliban Pakistan, reivindicou a responsabilidade.
Locais de culto ahmadi foram também atacados. A 6 de Fevereiro de 2020, uma multidão invadiu uma mesquita ahmadi de 100 anos em Kasur, no Punjab. As autoridades locais cederam à pressão dos extremistas e entregaram-lhes a mesquita. Em Outubro de 2019, outra mesquita ahmadi foi "arrasada" no distrito de Bahawalpur. Em Julho de 2002, um cemitério ahmadi foi profanado no Punjab.
Numa nota positiva, algumas pessoas condenadas por blasfémia viram as suas sentenças anuladas. Asia Bibi, uma mulher cristã condenada à morte por blasfémia em 2010, foi finalmente absolvida pelo Supremo Tribunal do Paquistão a 31 de Outubro de 2018. Contudo, devido a protestos de rua em grande escala, teve de esperar até Janeiro de 2019 para que a sua absolvição fosse novamente confirmada. Posteriormente, mudou-se com a família para o Canadá. Sawan Masih, outro cristão, foi também absolvido de uma acusação de blasfémia a 5 de Outubro de 2020. Estes casos não podem, contudo, apagar os longos anos passados na prisão pelos dois acusados. Além disso, representam êxitos isolados. De facto, os casos de blasfémia continuam a aumentar. Por exemplo, só em Agosto de 2020, havia 42 casos.
O Prof. Khalid Hameed, chefe do Departamento de Inglês do Colégio Público Sadiq Egerton em Bahawalpur, foi esfaqueado até à morte por um dos seus estudantes a 20 de Março de 2019 por alegadamente ter feito observações depreciativas contra o Islamismo.
Em Setembro de 2019, o director da Escola Pública de Sindh, na cidade de Ghotki (província de Sindh), foi preso por alegados comentários blasfemos sobre o Profeta Maomé. Seguiram-se protestos de rua e uma greve. Como consequência, a escola foi danificada e um templo hindu foi vandalizado.
Em Dezembro de 2019, Junaid Hafeez, um professor universitário de 33 anos, foi condenado à morte por blasfémia. Tinha sido preso em Março de 2013 sob a acusação de ter colocado comentários depreciativos sobre o Profeta Maomé nas redes sociais.
Num outro incidente, Tahir Ahmad Naseem, um cidadão norte-americano, foi morto a 29 de Julho de 2020 numa sala de audiências em Peshawar. Tinha sido preso por blasfémia em Abril de 2018, após ter afirmado ser um profeta. Foi divulgado um vídeo nas redes sociais que mostrava o suspeito de assassínio a dizer às pessoas na sala de audiências, após o assassinato, que o Profeta Maomé lhe tinha dito para matar o blasfemo.
Em Agosto de 2020, um líder muçulmano em Abidabad, Nowshera Virkan, acusou um cristão, Sohail Masih, de insultar o Islamismo. A polícia prendeu Masih a 5 de Agosto, depois de este ter sido atacado por uma multidão. A sua família foi forçada a fugir.
A violência e a discriminação contra a comunidade hindu do Paquistão também continuaram. A 30 de Junho de 2020, Jamia Ashrafia, uma escola religiosa líder no Paquistão, emitiu uma fatwa contra a construção do primeiro templo hindu de Islamabad, uma vez que estaria a "contribuir para uma má acção". O Tribunal Superior de Islamabad emitiu um aviso à Autoridade de Desenvolvimento da Capital de que o templo se enquadrava no plano director da cidade.
Entretanto, o problema das raparigas cristãs e hindus raptadas agravou-se. Asad Iqbal Butt, presidente da Comissão dos Direitos Humanos do Paquistão, constatou que o número de vítimas tinha duplicado desde 2018, aumentando para 2.000 raptos por ano. Os raptores, muitas vezes com a cumplicidade de polícias e funcionários judiciais corruptos, afirmam que as raparigas têm mais de 18 anos e que casam de sua livre vontade. Demasiadas vezes, os pais com documentos de identidade que mostram a verdadeira idade das raparigas não têm conseguido impedir conversões e casamentos forçados.
No início de Setembro de 2020, uma menina hindu de 14 anos, Parsha Kumari, foi raptada no distrito de Mori, Khairpur (Sindh), e terá sido convertida à força e casada com o seu raptor, Abdul Saboor Shah. Um caso semelhante foi o de Jagjit Kau, raptada à mão armada a 27 de Agosto de 2018, na cidade de Nankana Sahib. Após meses de rumores, incluindo alegações não substanciadas de que tinha sido devolvida à sua família, Jagjit foi colocada no abrigo de mulheres Darul Aman em Lahore. A 12 de Agosto de 2020, aparentemente a pedido dela, um tribunal decidiu que ela deveria regressar ao seu marido.
As raparigas cristãs são frequentemente vítimas deste tipo de crimes. Os casos são tantos que citaremos apenas o caso ainda activo de Huma Younus, uma jovem de 15 anos, que foi raptada a 10 de Outubro de 2019 em Karachi por Abdul Jabbar, um muçulmano que a violou, a converteu à força ao Islamismo e depois a forçou a casar com ele. Embora os seus pais tenham fornecido documentos que atestam que ela era menor de idade, o que foi confirmado mais tarde por exame médico, o Tribunal Superior de Sindh, a 3 de Março de 2020, manteve o casamento, citando que ela já tinha tido o seu primeiro período e que podia, portanto, contrair matrimónio. Isto apesar de a Lei de Restrição ao Casamento de Crianças em Sindh proibir o casamento de menores de 18 anos. O advogado da sua família disse que Huma falou com os seus pais ao telefone e lhes disse que tinha sido forçada a ter relações sexuais com o seu raptor, tendo ficado grávida, e que estava confinada a um único quarto na casa onde estava presa. Em Novembro de 2020, Huma Younus ainda estava raptada.
O caso de Arzoo Raza, uma rapariga cristã de 13 anos, mostra um envolvimento activo do poder judicial e de outras instâncias do Governo para confirmar as alegações de legalidade do referido casamento. Arzoo foi raptada e forçada a casar com um homem muçulmano de 44 anos. Neste caso, o Supremo Tribunal de Sindh considerou inicialmente o casamento válido, aceitando os argumentos do seu raptor, mas, após um exame médico, o mesmo tribunal considerou que ela era menor e ordenou que fosse devolvida à sua família. Uma outra audiência, a 23 de Novembro de 2020, decidiu que Arzoo deveria permanecer num abrigo gerido pelo Governo até aos 18 anos.
Mesmo depois da libertação, a vida no Paquistão para raparigas libertadas continua a ser muito dura. O caso de Maira Shahbaz revela como é difícil. A rapariga católica de 14 anos foi raptada em Madina Town, perto de Faisalabad, a 28 de Abril de 2020. A 4 de Agosto o Tribunal Superior de Lahore reconheceu o seu casamento como válido, mas duas semanas mais tarde ela escapou ao seu raptor. Maira e a sua família esconderam-se depois de receberem repetidas ameaças de morte.
Para o Cardeal Joseph Coutts do Paquistão: "A questão do rapto, conversões forçadas e casamentos forçados deve ser tratada com base nos direitos humanos fundamentais, em vez de ser vista como uma questão religiosa". Num apelo ao respeito pelos direitos das minorias, explicou: "É responsabilidade do Estado proporcionar protecção, assegurar justiça a todos os cidadãos, sem distinção de credo, cultura, etnia e classe social".
Infelizmente, estes direitos ainda não estão garantidos no Paquistão, como foi evidente durante o primeiro surto da COVID-19. Enquanto o vírus, apelidado por alguns de "vírus xiita", se espalhava, houve inúmeros relatos de recusa de ajuda alimentar e equipamento de protecção aos Hindus e aos Cristãos. Na área de Korangi em Karachi, os cristãos locais foram alegadamente obrigados a recitar o "Kalima", a declaração de fé islâmica, para poderem receber alimentos. Como recusaram, foi-lhes negado o essencial. Em contrapartida, a Igreja Católica distribuía alimentos e outros itens básicos a todos os necessitados, independentemente das diferenças religiosas.
Quanto às medidas no âmbito da COVID-19, enquanto as igrejas e templos em Punjab e Sindh foram encerrados voluntariamente pelos respectivos líderes religiosos após um aumento de infecções, as mesquitas permaneceram abertas. Temendo uma reacção negativa, o Governo optou por não intervir.
Apesar da promessa eleitoral do primeiro-ministro Imran Khan de um "Naya Pakistan", um novo Paquistão, no qual "os direitos civis, sociais e religiosos das minorias" são garantidos, o caminho para uma tal realidade é ainda muito longo e cheio de obstáculos. A sua visão de construir um "Estado de Medina" moderno, semelhante ao modelo estabelecido pelo Profeta Maomé há 14 séculos, está a contribuir para a radicalização num sistema político já altamente permeado pelo Islamismo.
Como a longa, mas não exaustiva, lista de incidentes acima referida indica, a religião neste país asiático continua a ser uma fonte de discriminação e de negação de direitos. Não é, portanto, surpreendente que em 2018 o Departamento de Estado norte-americano tenha designado o Paquistão como um País Particularmente Preocupante.
Discriminação, blasfémia, rapto de mulheres e raparigas, e conversões forçadas continuam a assombrar a vida quotidiana das minorias religiosas. O uso persistente de manuais escolares e currículos com conteúdo sectário contra xiitas e membros de minorias deixa pouca esperança para o futuro.
A tudo isto há que acrescentar a proliferação de grupos terroristas islâmicos, frequentemente perpetradores de ataques contra xiitas e minorias religiosas. O Tehrik-e-Taliban Pakistan e os seus grupos associados constituem a maior ameaça à segurança interna do país, enquanto a província estatal islâmica de Khorasan é particularmente hábil a explorar as frágeis fracturas sectárias do Paquistão. Em Maio de 2019, o autoproclamado Estado Islâmico anunciou a criação de uma "Wilayat Pakistan" (Província do Paquistão), após ter reivindicado múltiplos ataques na província do Balochistão.
A proximidade do Paquistão ao Afeganistão, o seu estreito envolvimento nas conversações em curso entre os EUA e os talibãs e no diálogo interno do Afeganistão, e as eleições presidenciais no Afeganistão irão certamente afectar a segurança interna do Paquistão. Isto, por sua vez, terá um impacto sobre as perspectivas já escassas de liberdade religiosa no país.